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Até ser expulso de um lindo castelo na Westfália, o jovem Cândido convivia com sua amada, a bela Cunegunda, e tinha a felicidade de ouvir diariamente os ensinamentos de mestre Pangloss, para quem “todos os acontecimentos estão encadeados no melhor dos mundos possíveis”. Apesar da crença absoluta na doutrina panglossiana, do primeiro ao último capítulo, Cândido sofre um sem-fim de desgraças: é expulso do castelo; perde seu amor; é torturado por búlgaros; sobrevive a um naufrágio para em seguida quase perecer em um terremoto; vê seu querido mestre ser enforcado em um auto da fé; é roubado e enganado sucessivas vezes. Cândido só começa a desconfiar do otimismo exacerbado de seu mestre quando ele próprio e todos os que cruzam seu caminho dão provas concretas que o melhor dos mundos possíveis vai, na verdade, muito mal. Cândido, ou o Otimismo é um retrato satírico de seu tempo. Escrito em 1758, situa o leitor entre fatos históricos como o terremoto que arrasou Lisboa em 1755 e a Guerra dos Sete Anos (1756-63), enquanto critica com bom-humor as regalias da nobreza, a intolerância religiosa e os absurdos da Santa Inquisição. Já o caricato mestre Pangloss é uma representação sarcástica da filosofia otimista do pensador alemão Gottfried Leibniz (1646-1716). Antecipando o sucesso desbragado e a carreira de escândalo do livro, Voltaire, pseudônimo de François-Marie Arouet, assinou a obra com o enigmático Sr. Doutor Ralph.
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A princípio, me impressionei com o uso constante do humor ácido na narrativa, distante da minha visão da escrita do século XVIII. A surpresa inicial me gerou boas risadas nos primeiros capítulos, mas a estratégia acabou se tornando repetitiva no ritmo acelerado da história. Isso não enfraquece a potência da sátira, só fez minha experiência com a história mudar com o tempo.
O embate entre cenas desagradáveis e eufemismos, metáforas e hipérboles deixa clara a denúncia em vários momentos (como aos horrores da guerra, da nobreza, da religião ou da crueldade escravagista), mas acaba caindo num espaço ambíguo entre naturalidade e desgosto em outros (como o secundarismo feminino ou a inferiorização de não-brancos). A valorização de uma sociedade não europeia é bem legal de se ver e Voltaire é muito eficiente em atacar absolutamente todas as partes da sociedade que o rodeava na época.
A constante mudança de cenário e personagens secundários me tirou um pouco do fluxo de leitura, e as conveniências e retornos de personagens em partes aleatórias do mundo também me geraram descrença, já que colocam a história num espaço mais de fábula que de denúncia realista. Mas tudo isso acaba se encaixando bem com a narração direta e incisiva do autor.
Por fim, as ilustrações da edição, por Pedro Meyer, são incríveis e recontextualizam a leitura, e o projeto gráfico da Antofágica amplifica muito o aproveitamento da narrativa. Foi uma experiência muito boa, em geral :)