Milton encena a viagem de autodescoberta e renovação do herói que lhe dá título. No primeiro livro do poema, John Milton regressa do céu ao mundo dos mortais. Sob a forma de um cometa, penetra no corpo de William Blake. A relação entre o poeta vivo e o seu predecessor dramatiza as pulsões contrárias da consciência individual, e uma luta sem tréguas pela afirmação da imaginação e da visão contra a mera exterioridade do mundo material. No segundo livro, Milton une-se à sua emanação feminina, Ololon, progredindo em direcção à superação apocalíptica das divisões entre sexos, entre vivos e mortos, e entre a consciência humana e as suas projecções alienadas no mundo exterior.
Este enredo integra inúmeras referências e alusões, que vão desde a Bíblia à vida pessoal de Blake, em particular a difícil relação com o seu mecenas William Hayley. Mas a reescrita dos mitos da criação e a recriação mítica de factos biográficos são apenas duas das múltiplas dimensões desta viagem psiconáutica. Milton é também uma obra sobre a dilaceração do sujeito humano e sobre a presença das forças genesíacas e apocalípticas do universo na forma e nos desejos do corpo.
A sua fantasia visionária é, antes de mais, um produto da letra e da escrita como invenção simbólica do humano e como emulação da forja criadora. Como nos restantes livros iluminados, os actos de escrever, desenhar, gravar, imprimir e pintar parecem conter, nas suas interacções, a própria possibilidade do pensamento.
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