«O que arde também cura. Quando, neste livro, nos deparamos com relâmpagos, brasas e incêndios, detectamos igualmente uma ideia de restabelecimento ou terapia, que se parece, aliás, com o seu avesso: uma doença febril, convulsiva, violenta. Os poemas de Cláudia R. Sampaio são disfóricos mas reactivos, respondem ao mundo e aos ataques do mundo, muitos deles sujos, asquerosos. Esse imaginário quase-abjeccionista não é uma pose, uma auto-indulgência, é a convicção de que, apesar de estarem "acima das condições atmosféricas", os poemas têm cabeça e têm corpo, ambos amotinados, complicados. Anotações citadinas confirmam então que os outros talvez sejam mesmo o inferno; elegias domésticas transformam os pais em criaturas mitológicas, terríficas; e poemas de perda e desejo combinam imagens agressivas e anáforas surreais-românticas. "Ver no Escuro" é uma sequência sobre o facto de estarmos vivos, ou antes, sobre a consciência e "infra-consciência" desse facto. Consciência que é um desassossego pessoano, uma exasperação tenebrosa, uma "melancolia aflita".» —P.M.
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