13 Segundos
13 Segundos
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Não lembro se já tinha ouvido falar sobre o assunto principal a ser discutido na história, mas fui lendo como quem não quer nada e de repente me vi sem acreditar no que tava acontecendo. Parabéns, Bel, por ter escrito essa história, abordado um assunto tão importante de uma maneira prática e numa medida boa entre tensão e simplicidade, sem florear e sem mascarar (acho que gostaria mais se tivesse se desenrolado por mais algum tempo, para dar uma aprofundada, quem sabe). Muito bom!
Em 13 Segundos acompanhamos a história de Lola, uma adolescente que poderia ser uma das suas amigas do ensino médio, e todos os desdobramentos que o término de seu namoro com Leo, seu primeiro amor, traz para sua vida. Mas sua história é um pouco mais do que isso. As situações pelas quais a personagem passa nos permitem tratar, além das dificuldades de um término de namoro, de relacionamento abusivo, pornografia de vingança, sororidade, base familiar e vulnerabilidade na internet [e mais]. E são nesses temas que irei focar neste texto.
Como leitura, a trama que Bel Rodrigues nos apresenta é bastante fluída. As relações de amizade e romance que seus personagens travam entre si conquistam o leitor logo nos primeiros capítulos. É uma história que consegue ser leve e ao mesmo tempo tratar de temas importantes.
Perdi a conta de quantas vezes escrevi aqui (uma e outra vez) que um dos papéis da literatura é representar a sociedade de seu tempo, então me parece óbvio que eu tenha que repetir isso aqui e acrescentar que é pela observação da representação da nossa sociedade que mais pessoas podem reconhecer comportamentos e atitudes que não são saudáveis em suas vidas (aquela velha história de “a arte imita a vida e a vida imita a arte”), dessa forma, é importante que uma história conte sobre uma adolescente que sente na pele quão longe um outro ser humano pode ir apenas por vingança e o quão importante é que as pessoas ao seu redor tenham consciência de como é errado.
Quando encontramos/conhecemos Lola, seu relacionamento já havia acabado e as aulas estavam recomeçando, de forma que não vemos em primeira mão como foi seu namoro com Leo. As observações de seus amigos e suas memórias sobre comportamentos do menino, no entanto, deixam claro para o leitor que o personagem tinha mais um sentimento de posse do que de real afeição pela garota. Ora, se qualquer pessoa acha que tem o direito de mandar na forma como seu companheiro se veste, fala, posta ou qualquer outra coisa, nós já sabemos que alguma coisa não está certa. Gostei da forma como a autora foi deixando que aos poucos Lola percebesse as matizes de seu ex namorado (aqueles detalhes que antes pareciam não ter importância) e como de forma crescente suas ações [do ex] levaram ao ponto principal da história. O que me leva a falar de pornografia de vingança.
Coincidentemente, neste semestre estou estudando as representações obscenas na literatura e no audiovisual e em um dos artigos teóricos que li, a pornografia de vingança foi listada como mais uma forma de um homem querer mostrar seu poder na vida de uma mulher. >> Parênteses: nós sabemos que não se limita a homens expondo mulheres, temos casos de mulheres expondo homens, mulheres expondo mulheres, homens expondo homens, mas vamos combinar que a maioria é sim de homens que “vazam” vídeos e fotos de ex namoradas porque temos não só o machismo intrínseco nessa atitude como uma série de outras coisas. << É essa demonstração de poder que leva um indivíduo a expor um outro, é a vingança atravessada pelo ciúme e posse. E o que temos aqui? Exatamente isso. Tudo o que vi de Leo me levou a pensar que o estrago que ele quase conseguiu fazer na vida de sua ex namorada foi completamente motivado pelo fato de não poder mais controlar Lola.
Apesar de apenas o terço final da história se dedicar ao desenvolvimento deste tema, a forma como foi tratado me deixou satisfeita por ser feita de forma delicada. Lola teve uma rede de amigos e familiares para lhe apoiar, o que mostrou não só sororidade entre mulheres, mas a noção de certo e errado. As amigas de Lola tiveram um papel importante na trama, Mel, Anna e Ariel são responsáveis não só por cenas e diálogos engraçados, mas por ações determinantes no antes e no depois. Em nenhum momento elas deixam de apoiar a amiga, em nenhum momento elas não deixam de reafirmar que Lola não tem culpa e que Leo é um babaca. Seus amigos homens também possuem papel na rede de apoio – Bruno, Vini, Diego e John são o exemplo de que nem todo garoto é um ser desprezível. Esse apoio é vital para Lola. Assim como o apoio de sua mãe e irmãzinha linda – elas são o centro do mundo da personagem. A base familiar dela é um dos núcleos mais bonitos do enredo, sua relação com a irmã adotada é de aquecer o coração de tão bonita e seu relacionamento tão confortável e baseado em comunicação com a mãe é um exemplo do que muitas filhas querem ter em casa. Lola conseguiu ter forças e criar coragem para levantar a cabeça e seguir em frente porque possuía diversas pessoas ao seu lado – o que toda adolescente deveria ter.
Vou abrir um parênteses aqui para falar de representação. Bel conseguiu trazer uma série de outras questões nas linhas de sua trama – personagens LGBTQ+, como Anna, Ariel e Bruno, adoção de crianças já crescidas, Nina... – que deixam a narrativa ainda mais real. Ela não trata do assunto como se fosse uma coisa do outro mundo – justamente porque não é – nem faz um alarde imenso para chamar atenção para esses pontos da trama. Eles estão ali, são bem retratados, e fico feliz por isso.
Meu medo não era que muitas pessoas me vissem cantando, mas sim a vulnerabilidade que a internet criava, o ódio que incitava, pessoas loucas cismando comigo, opiniões não solicitadas, xingamentos gratuitos.